Duas das minhas últimas leituras foram livros de não ficção escritos por mulheres negras: “Mulheres, raça e classe”, da norte-americana Angela Davis, e “Quarto de Despejo”, da brasileira Carolina Maria de Jesus.
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“Mulheres, raça e classe” foi publicado pela primeira vez em 1981 e chegou ao Brasil, em 2016, pela Editora Boitempo com tradução de Heci Regina Candiani.
Angela Davis faz uma análise crítica da história dos Estados Unidos a partir da perspectiva do povo negro, mais especificamente das mulheres negras. A autora escancara toda a construção de uma sociedade com base no racismo, sexismo, e elitismo a favor do capitalismo monopolista branco e masculino.
Cada capítulo é uma aula. E em cada aula vamos descobrindo personalidades importantes que lutaram contra essas opressões múltiplas ao longo dos anos. Pessoas que sofreram diversos tipos de violência por defenderem o ideal de uma sociedade igualitária. Angela também expõe os lados racista e classicista que o movimento pela emancipação feminina tinha logo que começou nos Estados Unidos.
Um livro essencial para entender as dinâmicas opressoras do sistema capitalista ao longo dos anos e a importância de se pensar, criticar e combater essas dinâmicas que até hoje se fazem presentes.
Se Angela Davis, com linguagem mais acadêmica e embasamento teórico, fala sobre a mulher e as opressões de gênero, raça e classe no contexto norte-americano, a brasileira Carolina Maria de Jesus, durante a década de 1950, escreveu em seu diário sobre ser mulher, negra e favelada no Brasil.
“Quarto de despejo – Diário de uma favelada” foi publicado em 1960 e traz testemunhos da vida sofrida que a escritora levava na favela do Canindé, em São Paulo, com seus três filhos. Carolina era catadora de papel e todo dia era encarado como uma luta pela sobrevivência.
Os livros e a escrita eram as companhias de Carolina. Encontramos nos registros da autora reflexões sobre temas como desigualdades sociais, racismo, política, relacionamentos, violências e educação. O mundo era cruel e ela respondia criticamente com educação e sensibilidade. Escrever era uma fuga da fome e da miséria da vida na favela.
“Quando eu não tinha nada o que comer, em vez de xingar eu escrevia. Tem pessoas que, quando estão nervosas, xingam ou pensam na morte como solução. Eu escrevia o meu diário.”
“Quarto de despejo” é uma ruptura na cultura e na narrativa hegemônica branca elitista que ditam o que é literatura. Uma obra escrita com base na oralidade e que coloca a mulher negra catadora de papel não como personagem de um livro sobre a favela, mas como narradora-protagonista. Dessa forma, Carolina afirma a sua existência e potência de simbolização do mundo.
Ola. Indico: Carla Akotirene, Djamila Ribeiro, Chimamanda Adiche e Livia Natalia.
Todas maravilhosas. Obrigada, Jacimar.
bjão
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