Uma das grandes surpresas da faculdade de Comunicação foi a fotografia. Tive a oportunidade de estudar e praticar a fotografia analógica e digital. Eu já flertava um pouco com a Tekpix, o Paint, o Flogão e o Fotolog, como uma boa millenials (a gente já se chamava assim? Eu acho que não). Tekpix, Cyber shot, a primeira Canon Rebel Xti, e, então, o primeiro smartphone, depois o primeiro iPhone. O dispositivo foi mudando e a experiência de fotografar foi se adaptando a cada dispositivo.
Em maio, eu li uma entrevista com o fotógrafo Sebastião Salgado, na VEJA SP. Salgado foi um dos profissionais que eu estudei durante a graduação e que colaborou com o meu encantamento com a fotografia. Na entrevista, ele diz que a fotografia de celular é uma “nova linguagem de comunicação através da imagem que a gente captura nos nossos telefones. Mas fotografia é outra coisa (mais profunda)”.
Sebastião defende a fotografia como um “espelho da sociedade”, “um recorte representativo da nossa sociedade”, uma prática que tem como papel ser a memória do corpo social. Entendo a diferenciação que o Salgado faz entre a fotografia de celular e a Fotografia (com a primeira letra maiúscula para mostrar a autoridade/superioridade proposta pelo fotógrafo). E vou pegar carona nessa diferenciação para dizer que a fotografia de celular é também o “espelho da sociedade”, “um recorte representativo da nossa sociedade”, da nossa sociedade hiper conectada, acelerada, imediatista, a sociedade do espetáculo, aquela que tem uma memória efêmera, a que captura para todo mundo vê, porque ser visto é o que mais importa.
Pagamos caro para visitar pontos turísticos e tirar a mesma foto que vimos no Instagram. Colecionamos momentos iguais a vários desconhecidos, uma espécie de inveja turística digital coletiva. Inclusive aceleramos a experiência para não perder a oportunidade e dar logo a vez para o próximo da fila.
Bem, eu sou bellhooksniana, e aprendi com ela a fazer a autocrítica. Vou criticar o inimigo externo, mas antes vou confrontar o inimigo interno porque vamos preservar também a honestidade e a coerência (risos).
Quando comecei a me aproximar da fotografia de celular, deixei a Fotografia de lado. Entrei na onda do clicar e publicar instantaneamente. Eu clicava para publicar. E não mais para exercer a minha criatividade ou para fazer algo que eu gostava tanto: andar por aí prestando atenção e registrando coisas que eu não sei o nome. As câmeras ficaram enfileiradas na estante de livros enquanto eu saía com o celular e o Kindle na bolsa. Clicar e publicar. Registro instantâneo. O meu pequeno reality show de imagens. Os likes. Os comentários. A bateria em 10%. É preciso parar porque tem que chamar o Uber também.
Mas eu comecei a querer desacelerar vários âmbitos da minha vida porque percebi que estava acelerada demais e isso não estava me fazendo bem de modo geral. Slow down, you crazy child. Aproveito para dizer que desacelerar não é necessariamente andar devagar, mas sim entender e respeitar o seu ritmo dentro de uma sociedade que tem como valores a velocidade e o produtivismo. É se perguntar: Até onde eu posso ir, até onde eu aguento ir, nesta sociedade do desempenho e da produção, para viver bem sem me esgotar, sem adoecer?
Resgatei a velha ideia de ter um hobby, um passatempo, uma atividade que a gente faz porque gosta, nos dá satisfação, nos relaxa e, principalmente, a gente não precisa ser uma profissional super capacitada. O hobby não precisa ser mais um grande estudo, mais uma grande meta a ser atingida no final do ano. Foi assim que eu tirei a poeira das minhas câmeras fotográficas. Coloquei para carregar. Limpei alguns cartões de memória, o que me fez rever algumas fotografias esquecidas neles. E fiz um acordo afetuoso comigo: a partir de agora, qualquer viagem, qualquer passeio, qualquer evento, vou levar uma das câmeras.
Melhor acordo afetuoso do ano. Me fez lembrar porque me apaixonei pela fotografia e amava as saídas fotográficas na faculdade. É sempre terapêutico. É sempre valioso. Fotografia me faz andar mais devagar, aqui também no sentido de diminuir o ritmo do passo para olhar os detalhes, para experienciar, apreciar, ser paciente e esperar o melhor momento do clique. Amo e me faz bem. É uma outra forma que encontrei de respirar mais profundo.
Tenho pensado muito nessa coisa do clicar pra postar também… não tenho mais minhas saudosas câmeras digitais, mas deu até vontade de arrumar uma viu
Tem sido bom fazer esse movimento por aqui. 😉