Já faz um tempo que um livro me chama bem de longe.
Bem de longe porque ele nem sequer ocupava um lugar na minha estante.
Me gritava através do seu título que me intrigava e me levava a pensar nos possíveis porquês. Também me gritava através da capa que me trazia uma familiaridade desconhecida.
Um pouco teimosa que sou, passei alguns livros na frente. Ou pelo menos tentei, em vão. Nenhuma leitura fluía. Até que resolvi me deixar ouvir o chamado de Torto Arado, do baiano Itamar Vieira.
Me deixei levar pela história das irmãs Belonísia e Bibiana que se passa pelos ares da Chapada Diamantina, lugar que tanto amo. Adormeci, inúmeras vezes, lendo o livro. E adormecer lendo um livro é um dos pontos altos do relacionamento com a leitura. Você lê até que as letras embaralhem e os seus olhos pisquem lentamente. Você volta, tenta continuar, tudo fica meio fosco até que enfim você adormece ao lado do autor e de suas personagens. No seu sonho todos aparecem de alguma maneira para lembrar que “se a gente não se movimenta, não tem vida”. E quando acorda lá estão todos esperando o continuar da leitura.
No movimento do passar das páginas encontro histórias de sobreviventes, um povo colocado na posição de subalternidade no processo de construção de uma sociedade desigual. O movimento também é luta. É vento. É a seca; a chuva. É o tempo passando sem dó e com pouca piedade. É o balanço da plantação e das roupas e corpos na festa do Jarê. Movimento que vem da ancestralidade trazendo força e acalento para tempos difíceis.
Entre idas e vindas, entre as desventuras da vida das suas personagens, Torto Arado me recorda um Brasil, entre tantos Brasis, que segue lutando com as armas que possui contra o memoricídio e a necropolítica.
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