Certo dia resolvi navegar pela piscina infinita da Netflix em busca de algo para ver. Eu olhei a minha lista (nunca vou entender porque faço essa lista se nunca vejo o que coloco nela), a lista de “TOP 10 de hoje no Brasil”, a lista “em alta”, a lista de lançamento, e bateu o tédio. Infinitas possibilidades, mas tédio. Acho que você também já deve ter passado por isso. E não é à toa que virou meme o fato de a gente passar mais tempo escolhendo o que assistir, do que realmente assistindo.
Bem, eu queria ver algo inspirador, algo que me desse aquele quentinho no coração mesmo, uma produção atual, em um lugar bonito. E, olha só, a Netflix na sua piscina infinita tinha criado uma raia “porque você assistiu a Doces Magnólias” e estava lá a série Virgin River. Resolvi me deixar levar pelo algoritmo (quando não?) e nadei sem preocupações.
Virgin River é uma série original da Netflix, lançada em 2019, e inspirada na série de livros homônima escrita pela autora norte-americana Robyn Carr. Já vou logo avisando que é um drama romântico clichê. A produção tem como cenário uma cidade no meio do nada no norte da Califórnia. E conta a história da enfermeira Mel (Alexandra Breckenridge), natural de Los Angeles, que se muda para Virgin River em busca de um recomeço. Eu já tinha avisado que era clichê? Mas, minha gente, às vezes tudo que a gente precisa é de um belo clichê.
Eu gosto desse tipo de série porque o tempo é mais lento, temos poucos personagens, há diálogos um pouco mais longos e reflexivos, pessoas em busca de recomeçar a vida e resolver questões do passado.
– Santo algoritmo da Netflix, continue me fazendo feliz sofrendo com séries dramáticas, simples, que se passam em cidades pequenas e lindas. Amém!
Por ter como personagem principal uma enfermeira e parteira, Virgin River traz alguns temas interessantes da área da saúde, principalmente com foco em saúde mental e maternidade. Há algumas cenas interessantes sobre depressão pós-parto e estresse pós-traumático. Vale dizer que a série não se propõe a discutir com profundidade esses temas (pelo menos não na primeira temporada), mas considero pequenos alertas necessários.
Sou canceriana e produções assim me emocionam porque mostram como que para viver bem devemos buscar a solidariedade, a empatia, o cuidado de si e alianças.
Hábitos ensaiados, o título dessa crônica, vem de um diálogo de Mel com Jack (Martin Henderson), o bonitão gente boa dono do único bar da cidade, enquanto conversavam sobre ambos aparentarem ser pessoas calmas. Hábitos ensaiados são aquelas ações que fazemos para nos proteger principalmente da vulnerabilidade. Ou a famosa armadura que vestimos para nos proteger muitas das vezes da gente mesmo. Ou comportamentos que a gente ensaia para tentar pensar antes de agir, ter menos impulsividade. Pode ser algo bom ou algo ruim. Acredito muito que depende muito do porquê ensaiamos esses hábitos. E se o que há por trás disso é controle obsessivo ou realmente inteligência emocional.
Fiquei pensando bastante sobre hábitos ensaiados. E no quanto isso está presente em diversas áreas da nossa vida. Até que a série traz novamente a temática através de outra personagem, a Hope (Annette O’Toole), a prefeita enxerida da cidade. Em conversa com Mel, Hope diz: “Protegendo o coração você pode acabar evitando muita dor de cabeça, mas também viver uma meia vida.”
A escritora Brené Brown diz que vivemos uma cultura do perfeccionismo e do controle, o que podemos traduzir ou simplificar aqui como hábitos ensaiados. Nem preciso de uma série como Virgin River para me lembrar disso, ou talvez eu precise e por isso eu me deixei levar pelo algoritmo e estou agora escrevendo sobre o assunto. Não preciso dizer, mas vou dizer, que estou falando dos hábitos comportamentais negativos, como o autocontrole excessivo, a busca pelo perfeccionismo, a autocrítica excessiva, o apego aos erros do passado. Esses tipos de hábitos nos fazem viver uma meia vida.
Brené nos faz um chamado a coragem e nos pede para abraçar a vulnerabilidade. Aceitarmos que não somos perfeitos e vamos errar diversas vezes. Os nossos erros não nos definem, mas fazem parte de quem fomos e de como podemos ressiginificar o que ainda temos para viver.
Kristin Neff outra escritora que nos faz repensar sobre autocrítica, nos faz o chamado para autocompaixão. Ao invés da autocrítica que nos faz questionar se somos bom o suficiente, a autocompaixão nos leva a questionar se algo é bom para mim.
Virgin River para mim falou muito sobre vulnerabilidade e autocompaixão. Me trouxe esse alerta de observar quantos hábitos estou ensaiando para parecer ser alguma coisa nessa sociedade do perfeccionismo e do controle.
Eu já assisti essa série e achei ela bem legal, as vezes a gente precisa de algo leve e clichê né!
Eu nem tinha prestado muito atenção sobre hábitos ensaiados, gostei de como você falou sobre isso e eu percebi alguns hábitos ensaiados que já tive. Gostei do post. Beijos
Sim, ainda mais em tempos como o que estamos passando. Já quero a segunda temporada. E acho que pode estrear em 2020. Obrigada pelo retorno. beijos
Eu comecei a ver a série há uns meses, mas acabei abandonando justamente porque as coisas pareciam lentas demais. Mas sua percepção me deu vontade de dar uma segunda chance, vendo com outros olhos.
Que reflexão sensível e importante! Obrigada por partilhá-la.
Oi, Fernanda! Ela tem um ritmo mais lento mesmo. Eu gosto. Obrigada pelo retorno.
Abs
Eu adorei essa indicação e toda essa reflexão que você teve por conta da série. E sim, precisamos de um bom clichê de vez em quando, vou colocar essa série na minha listinha.
Beijos
Carol Justo | Justo Eu?!
Obrigada, Carol!
Clichês <3
Abs
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