A louca da casa (Rosa Montero)

Eu finalmente li o “A louca da casa”, da escritora e jornalista espanhola Rosa Montero. E hoje quero compartilhar a minha experiência de leitura, o que ficou desse livro em mim, o que ele me fez pensar sobre a vida.

Eu não fazia ideia do que era esse livro, mas sempre tive vontade de ler por causa do título “A louca da casa” e dessa capa que eu acho vibrante, impossível que não chame atenção em qualquer prateleira.

Lendo descobri que é um grande ensaio sobre a literatura, a narrativa, o ser romancista/escritor, mas também é sobre a louca da casa, que é como a Rosa chama a imaginação, o ponto de partida da maioria das narrativas e o que move muitos escritores. Além também de ser um livro sobre loucura, paixões amorosas e, é claro, a vida da Rosa Montero. Ele é autobiográfico, se nós leitores acreditarmos que a Rosa é uma narradora confiável.

O livro é dividido em 19 partes, sem títulos. Há muitas histórias sobre a vida de outros escritores, inclusive muitos clássicos, para exemplificar os temas abordados. E também episódios curiosos e engraçados da vida da autora, já que como ela mesma diz suas lembranças são organizadas em torno de namorados e livros.

Vou compartilhar alguns pontos que me chamaram atenção ao longo da leitura:

1) Todo ser humano é um narrador

Por acreditar que literatura é vida, Rosa também diz que todo ser humano é um potencial narrador e romancista.  “Nós nos mentimos, nos imaginamos, nos enganamos” durante toda a vida, e somos autores de um romance único que vamos escrevendo ao passar dos dias e que assumimos o papel de protagonista.  Concordo demais, e se levarmos essa possibilidade de cada ser humano ser um romancista, um grande narrador da própria vida para o nosso momento atual, em que vivemos conectados, podemos dizer que criamos narrativas diárias nas redes sociais, sobre quem somos e como vivemos.

2) A imaginação é a louca da casa

Meu Deus, sim! A casa é nosso corpo, nossa existência. E a louca desse lugar é a imaginação. Eu tenho uma imaginação muito fértil. Eu olho para pessoas, coisas, momentos, até fotografias, e invento narrativas. Às vezes é bem complicado conviver com tantas ideias na cabeça, que estou pensando seriamente em passar a escrevê-las.

Rosa também fala de como vamos limitando nossa imaginação à medida que vamos crescendo porque ficamos naquela ideia de que imaginar, dar asas a imaginação, é coisa de criança. Então de certa forma, ser romancista é deixar um pouco viva essa criança que fomos um dia e conviver bem com a louca da casa.

3) Compromisso da escrita

Há um compromisso ao escrever. Rosa diz que o escritor deve “permanecer sempre alerta contra o senso comum, contra o preconceito próprio, contra todas ideias herdadas e não questionadas que se infiltram insidiosamente em nossa cabeça”.

Olha que fantástico isso: “permanecer sempre alerta…contra todas ideias herdadas e não questionadas que se infiltram insidiosamente em nossa cabeça.”

Acredito que é um compromisso do escritor, mas é também um compromisso de qualquer pessoa que deseja olhar para o seu tempo, seu lugar, de forma crítica. Trazendo para o hoje, vivemos um momento de fake news. Por que as pessoas recebem uma notícia e não a questiona, não buscam em outras fontes, não checam? Preguiça de pensar e o desejo de permanecer na zona de conforto com suas próprias ideologias e verdades.

Muitas das pequenas ou grandes revoluções começaram por conta de um questionamento. Escrever é um ato político, e ler também é.  Fiquei pensando bastante nessas questões quando Rosa falou sobre o compromisso da escrita.

4) O peso semântico do feminismo

Na parte 13 do livro, Rosa vai admitir que é anti-sexista por conta do peso semântico que o feminismo tem, mas respeita os movimentos feministas e também se considera uma feminista e usa essas palavras por reconhecer a importância histórica e atual dos movimentos.

Essa parte do livro é muito boa porque ela vai comentar sobre duas perguntas que não aguenta mais responder: Existe uma literatura de mulheres? Prefere ser jornalista ou escritora?

O peso semântico do feminismo é forte mesmo. Muitas pessoas só de ouvirem a palavra já abominam os movimentos e não gostam do feminismo porque atribuem um significado com base no senso comum: é a oposição ao machismo, é a mulher dominando o mundo. Sendo que não é. É uma luta por equidade. É uma luta como diz a Simone de Beauvoir para que a mulher seja não seja o outro, o que vive a margem, subalternizado, o segundo sexo. Além de ser uma luta que questiona a cultura machista que impõe também estereótipos sobre o ser homem.

5) As mulheres dos escritores

A parte 16 também me chamou atenção. A Rosa traz algumas mulheres que abdicaram da vida própria para viver em função dos seus maridos escritores e que ainda eram vistas como megeras e loucas. Ela chama inclusive as esposas dos escritores de uma “antiga instituição literária”, que felizmente está em processo de extinção. Ela fala muito de Fanny, esposa de Robert Louis Stevenson (autor de O médico e o monstro) e Sonia Tolstoi, esposa de Leon Tolstoi.

É só um exemplo de que durante muito tempo a mulher foi sempre vista como parte da vida de um homem e não alguém com vida própria. O homem tinha direito pela vida da mulher.

Aqui também acho interessante ler “Um teto todo seu”, da Virginia Woolf, e “Os homens explicam tudo para mim“, da Rebecca Solnit.  


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3 comentários em “A louca da casa (Rosa Montero)

  1. Oi Jeniffer, essa frase do Vargas Llosa na capa é um convite para a leitura, né? Adorei o “papo” sobre o livro aqui no post. Eu adoro ler sobre literatura e processos criativos, acho que vou gostar muito da leitura. Mais um para a listinha! 😉

    Beijo, beijo :*
    http://naomemandeflores.com

    • O Llosa caiu no meu conceito hahaha mas esse livro é maravilhoso. Acredito que vc vai gostar.
      bjão

  2. Pingback: quando trava, engasga - Jeniffer Geraldine | Blog